Importador deve ser indenizado por terminal portuário e Antaq
Por: Arthur Rosa
Fonte: Valor Econômico
Um importador obteve na Justiça Federal o direito de ser indenizado por
atraso na retirada de mercadorias de contêiner - a chamada desova - e na
entrega do equipamento ao responsável pela operação do navio, o armador.
O valor deverá ser pago pelo Terminal de Contêineres (Tecon) de Salvador
e pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).
O atraso na retirada das mercadorias do contêiner se deu em razão da
paralisação dos auditores fiscais da Receita Federal, finalizada recentemente. O
terminal portuário alegou que, com o atraso nos desembaraços aduaneiros por
causa do movimento, não teria espaço para armazená-las até a conferência, pela
fiscalização, da importação, que caiu no canal cinza - procedimento que envolve
um exame mais detalhado da operação, geralmente por suspeita de fraude.
Sem a devolução do contêiner, o armador passou a cobrar o que o mercado
chama de “demurrage”, uma indenização pelo período adicional de uso do
equipamento. No caso, foram cobrados R$ 1,2 mil por dia. A dívida, após o
terminal cumprir liminar dada em mandado de segurança para a desova da
mercadoria, ficou em cerca de R$ 40 mil.
Em sentença, proferida após recurso (embargos de declaração) apresentado
pelo importador, o juiz Carlos D’Avila Teixeira, da 13ª Vara Federal Cível da
Bahia, reconheceu a responsabilidade do terminal portuário e da Antaq pelo
prejuízo gerado. A questão não tinha sido analisada inicialmente pelo
magistrado.
“À luz do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, que estabelece a
responsabilidade objetiva do Estado e das entidades prestadoras de serviço
público por danos causados por seus agentes, mostra-se juridicamente viável o
reconhecimento da responsabilidade civil da Antaq e do Tecon pelos prejuízos
causados à impetrante, pro rata, em razão da negativa de prestação do serviço
essencial”, diz o magistrado na decisão.
Contudo, acrescenta, tratando-se de mandado de segurança, “não se mostra
possível a execução imediata dos valores, decorrentes do uso do contêiner além
do prazo acordado para sua devolução, devendo eventual cobrança ocorrer por
meio de ação própria, pelo rito ordinário, com observância do contraditório e
da ampla defesa para apuração do montante efetivamente devido”.
Na sentença, o juiz destaca ainda que o contêiner é considerado um
equipamento utilizado para o transporte de mercadorias, “não se confundindo
com a carga nele acondicionada, motivo pelo qual não podem ser retidos pela
fiscalização alfandegária na hipótese de eventuais irregularidades decorrentes de
operações de importação”.
Ele acrescenta que a Portaria nº 143/2022, editada pela Receita Federal, prevê
em seu artigo 9º, inciso IV, que a administradora do local ou recinto deverá
disponibilizar instalações segregadas e áreas para contêineres, quando aplicável,
exclusivas para guarda e armazenamento de mercadorias retidas ou apreendidas.
A advogada Carolina Silveira, que atua na defesa do importador, lembra que
muitas empresas foram impactadas pela greve da Receita, mas que não haveria
nenhum impedimento legal para a desova do contêiner e devolução ao
proprietário no curso da fiscalização aduaneira. “Após notificação extrajudicial,
tivemos que impetrar um mandado de segurança para garantir a desova”, diz
ela, acrescentando que a Antaq também consta como ré “por omissão em seu
dever de fiscalizar a execução do contrato de arredamento do terminal
portuário”.
A decisão é interessante, segundo o advogado Bruno Felipe Ferreira, do
Finocchio & Ustra Advogados, em razão dos interlocutores. Normalmente,
afirma, as empresas entram com ações contra a União - e não contra o terminal
portuário ou a Antaq - em razão da demora para o desembaraço aduaneiro.
“Foi coerente [a decisão]. A demurrage, em muitos casos, gera um custo muito
elevado para o importador e pode impactar o valor do produto para o
consumidor final”, diz ele, destacando que o fato de a Antaq ser condenada
pode levá-la a discutir o que pode ser feito quando o importador não der causa
à demora na entrega de contêiner. “Se houver condenação de forma reincidente,
ela [a Antaq] pode querer agir e criar normas para diminuir sua responsabilidade
ou aumentar a responsabilidade do agente portuário.”
Em nota, o Tecon Salvador informa que continuará adotando todas as medidas
cabíveis, em conformidade com a legislação, para assegurar a defesa dos seus
interesses. “O terminal reforça que a discussão judicial não altera a solidez da
relação com seus clientes, pautada pelo compromisso com a segurança, a
transparência, a qualidade dos serviços e o cumprimento de todas as obrigações
assumidas”, afirma.
O Valor não conseguiu contato com representante da Antaq para comentar a
questão.